quinta-feira, julho 22, 2010

O parto

Desde quando me vi grávida desejei o melhor para o meu bebê, e isso incluía o momento do seu nascimento. Depois de muitas leituras descobri um mundo onde me senti a vontade: o do parto natural. 
E eu queria mais que um parto normal hospitalar, queria um parto sem intervenções. Então, durante a gestação, mudei várias vezes de Ginecologista até achar um que fosse a favor dos meus pensamentos. Construí um plano de parto para ter minha menina em uma casa de parto num hospital público humanizado de Belo Horizonte: o Sofia Feldman.
Tive que lutar muito, principalmente contra meu pai que achava um absurdo pagar plano de saúde para mim e eu desperdiçar "esse luxo" tendo filho no SUS.
Deixo aqui o relato do meu parto, para quem interessar:


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RESUMO:
O PARTO foi de cócoras, sem episiotomia, tricotomia ou enema. Aos 40min. do segundo tempo pedi arrego e recebi analgesia peridural quando estava com 9cm de dilatação. Depois descobri que a dor que senti foi tão intensa pela posição da cabeça da Letícia, ela nasceu na posição occipito sacro e tinha 2 circulares de cordão. Não tive laceração nem escoriação.

O RELATO:
Havia marcado o chá de fraldas da Letícia para o dia 07/12/08 (domingo), tínhamos 36 semanas e 2 dias, mas eu estava bem disposta e sabia que agüentaria a farra. O chá foi uma delícia, vários amigos queridos vieram, me diverti até... Porém para que o chá saísse tivemos um trabalhão. Como a casa dos meus pais (onde eu moro) estava em reformas, começamos a faxina na sexta-feira (05/12/08), e a bagunça não acabava... no sábado continuávamos na limpeza, eu fui varrer terreiro e depois fiquei exausta. Domingo, foi o grande dia, estava tudo pronto para o chá, aí fiquei muitas horas em pé cumprimentando e conversando um pouquinho com cada um dos meu amigos.
            Na Segunda-feira, dia 08/12/08, comecei a sentir uma dorzinha semelhante a cólicas menstruais e notei que algumas vezes quando ia ao banheiro saía uma secreção transparente com filetes de sangue, pensei ser o tampão, mas sabia que se fosse o parto ainda poderia demorar bastante, então nem liguei muito para o sinal.
            Na Terça e na quarta (09 e 10/12) o quadro se repetia, minha mãe que já estava meio apavorada me pedia que ligasse para meu GO – Dr.Lucas Barbosa -. E eu falava que estava tudo normal, que deviam ser falsas contrações porque eram bem fraquinhas, mas resolvi ceder, não porque estivesse preocupada com meus sintomas, mas queria saber se minha filha estava bem. Porém não consegui falar com o Dr.Lucas, pensei: amanhã eu tento de novo.
            Acordei na quinta feira (11/12) com a mesma dorzinha semelhante à de cólica menstrual, super suportável e com os filetes de sangue saindo às vezes. Como prometido tentei falar novamente com o Dr.Lucas, só por desencargo de consciência, porém não obtive sucesso no celular dele, e ao ligar no consultório me disseram que ele havia viajado. Fiquei um pouco apreensiva, o Dr.Lucas é um profissional incrível que em todas as minhas consultas (que não foram muitas, afinal ele foi o 4º GO que passei durante a gestação) me passava muita segurança, sempre me incentivou a ter um parto normal e sempre me demonstrou que eu era capaz disso, então queria que ele estivesse comigo nesse momento, seria importante ter alguém que acreditasse no meu poder.
Resolvi ligar para a Danúbia (enfermeira obstétrica que foi professora de uma amiga minha que estuda enfermagem, era uma pessoa de quem eu só tinha ouvido falar coisas boas e trabalhava no Hospital em que eu pretendia ter minha filha), só que o celular dela só dava desligado.
Precisando de uma opinião liguei para minha amiga Luciana, estudante de enfermagem, e contei todos os meus sintomas, ela me mandou ir na mesma hora pro hospital, fiquei meio sem chão, pois não tinha arrumado nada ainda, será que eu deveria mesmo ir pro hospital? Ela disse que era melhor pecar pelo excesso do que pela falta, pensei na Letícia, liguei pro Leandro, pai da Lê, e falei pra gente ir pro Hospital, ele assustou um pouco, mas nós dois achávamos que iríamos voltar, achávamos que ainda não era o TP. Minha mãe também saiu do serviço e veio para ir com agente, passei 4 peças de roupas da Letícia (que ainda não estavam passadas), arrumei nossa mala (muito mal arrumada) e fomos pro Hospital...
Chegamos lá, no dia 11/12 (quinta) por volta de 13:00, e ficamos aguardando atendimento, a maioria das mulheres que foram atendidas antes de mim (muitas chorando de dor) voltavam pra casa pois ainda não estavam em trabalho de parto...e eu sentindo minhas leves cólicas.
            Quando fui atendida (era mais de 16:00) a enfermeira perguntou o que eu sentia, contei os sintomas e ela disse que o que estava saindo de mim provavelmente era o tampão, pediu pra eu tirar a calcinha que ela faria um toque, quando levantei a perna ela confirmou: é mesmo o tampão, fez o toque e se assustou, disse: nossaaa você já está com 5cm de dilatação, e com essa carinha boa, provavelmente vai conseguir seu parto normal (já tinha dito que queria ter a Letícia na água na Casa de Parto), fiquei super animada com a notícia dela, afinal eu com 5cm não estava morrendo de dor, então seria fácil né?
Para minha desilusão o médico que encaminha as pacientes me disse que eu não preenchia o protocolo da Casa de Parto (estar acima de 37 semanas) e que ele não poderia me mandar pra lá, disse que se por acaso meu TP de parto não evoluísse, no dia seguinte eles poderiam rever meu prontuário e quem sabe me mandar pra Casa de Parto, mas já me avisou que provavelmente isso não ocorreria, pois meu TP já estava na fase ativa. Meu mundo desabou, perdi o chão na hora, comecei a chorar no meio da "avaliação", a enfermeira com meu pedido de internação, e eu sem saber o que fazer, porque eu só tinha ido pra lá pra ter a Letícia na casa de parto, caso contrário eu pensava que a teria num hospital particular que meu convênio cobre, então pedi a ela pra pensar no que eu faria, saí de lá de dentro chorando e contei tudo pra minha mãe, ficamos eu, ela e o Leandro conversando um tempão.
Como o que no fundo eu queria era um parto normal e não luxo resolvi aceitar ficar no Sofia mesmo, que é um hospital do SUS. Preenchemos minha guia de internação e fomos (Leandro e eu) para sala de pré parto.
            Já que eu ia ficar lá mesmo o jeito era fazer com que meu TP fosse o mais tranqüilo possível. Pedi uma bola pra sentar e ficar rebolando, pois sabia que ajudava, e o Leandro sentado atrás de mim massageando minhas costas. Às vezes deitava para que a massagem “fizesse mais efeito”, pois deitada a massagem estava aliviando mais a dor. Outras vezes caminhei, ia até lá fora ver meus familiares e também tomei um banho no chuveiro, foi muito aliviante.
            Aí a enfermeira fez outro toque (acho que o toque era feito de 3 em 3 horas, então devia ser umas 19:00hrs) e eu estava com 6cm de dilatação (sinal que o TP estava mesmo evoluindo)...
Em uma certa hora meu pai me liga e insiste muito para que eu mudasse de hospital, e eu não aceitei. Ele foi pro Sofia, saí lá fora pra conversar com ele, e ele continuou insistindo para eu ir para um Hospital Particular, disse que não pagava convênio atoa, que eu tinha que usar do serviço, que eu tinha que ficar bem acomodada, que minhas visitas deveriam poder ficar comigo, e bla bla bla...eu comecei a chorar falando que não queria fazer uma cesárea, aí ele disse que se tivesse que ser cesárea seria tanto no Sofia quanto no outro hospital, e eu disse que não, que lá eles inventam desculpa, que a taxa de cesárea é 80% enquanto no Sofia é de 15%, e voltei chorando pra sala de pré parto, ele foi atrás de mim e continuou falando na minha cabeça... que eu ia ficar no meio daquele povo todo (nesse dia o hospital estava bem cheio), que eu não tinha conforto, não tinha privacidade, tinha que dividir banheiro, inclusive mandou chamar o obstetra que estava de plantão pra ver se ele autorizava minha transferência numa ambulância... Fiquei super irritada, o obstetra, era um senhor, chegou todo solícito, inclusive disse que os 3 filhos dele nasceram de parto normal no hospital para o qual meu pai queria que eu fosse, mas que foi porque ele quem auxiliou os partos, e disse que não aconselhava a essa altura do campeonato, uma transferência porque meu parto poderia tanto demorar ainda mais 48hrs quanto poderia ocorrer após meia hora, e se no meio do caminho minha bolsa estourasse seria arriscado para a Letícia que ainda era considera prematura e precisaria de cuidados especiais.
Foi aí que meu pai parou de encher um pouco o saco, mas falou que eu não deveria ter ido pra lá, etc. etc. Nessa hora fiquei tão nervosa que as dores ficaram muito fortes, devia ser umas 21:00hrs e meu pai começou a medir o intervalo das contrações que estavam de 2 em 2 minutos.
            Comecei a chorar PORQUE TAVA MTO FORTE e pedi analgesia, meu pai ainda começa a falar: “uai você não queria parto natural?” Comecei a pedir pra ele sair e falei que queria o Leandro comigo de novo, aí ele falou que não ia sair que ia marcar mais umas contrações, e elas já estavam com intervalos de minuto e meio mais ou menos, e eu já chorando de dor comecei a gritar por anestesia. A enfermeira chegou falando que não era assim, que não podia me dar anestesia porque eu estava com 6cm, senão meu TP poderia parar, que era pra eu esperar uma hora que ela faria outro toque, e se a dilatação tivesse evoluído para 7cm aí ela me daria anestesia. Eu falei que não conseguiria esperar 1hora, que queria agora, que tava morrendo de dor, que com certeza eu não estava só com 6cm de dilatação, gritei muito, insisti muito, aí ela aceitou fazer o toque naquele momento pra avaliar, ela fez uma cara de espanto e falou: 9cm de dilatação...
Então me pediu que esperasse o anestesista desocupar, e que depois me chamaria pra ele fazer a minha anestesia, nessa hora as dores estavam tão fortes, que nem me lembro como andei da sala de pré-parto até o local onde tomei a anestesia, só me lembro do momento em que eu já estava sentada na “maca” esperando o anestesista chegar, sei também que tinha muito sangue. É impressionante como o corpo é perfeito, age por si só, agente não precisa fazer nada e seu organismo está lá, vivo, se movimentando para trazer a vida. Meu pai saiu e foi chamar o Leandro que ficou comigo, segurando minha mão, fazendo massagens e ouvindo meus gritos (gente gritei demais, sério!). E o anestesista demorava, e eu gritava e o Leandro ficava nervoso porque ninguém aparecia pra nos atender, e as enfermeiras pediam pra gente esperar, falavam pra eu ficar calma, e eu falando que ia desmaiar de dor. As contrações duravam uns 50 segundos mais ou menos, e o intervalo entre elas era de 1 minuto, ou seja, NÃO DAVA PRA RELAXAR, eu não conseguia mais, estava muito tensa, tudo que eu li, estudei e aprendi nessa hora já não se aplicava mais, acho que a única coisa que conseguia fazer ainda era respirar, as contrações estavam quase emendadas umas nas outras. Sei que nessa fase eu dei muito trabalho.
            Finalmente o anestesista chegou, o Leandro disse que parecia que ele vinha andando em câmera lenta no corredor eheheh, mas sei que era o desespero. Foi um alívio INEXPLICÁVEL quando a anestesia fez efeito. Senti-me muito bem, estava pronta para continuar. E fui para um box de parto. Deitei um pouco para descansar, estava bem disposta, mais animada, as dores não tinham ido embora, mas ficaram amenas e bem suportáveis. Com o tempo a anestesia vai passando, mas aí já tinha dado tempo de descansar...
            A Danúbia foi a enfermeira que assistiu meu parto, nosso anjo, que eu já conhecia de nome e pela internet, sem a ajuda dela eu tenho certeza que não conseguiria, se tivesse no hospital particular com certeza teria pedido cesárea, tava doendo muito! Ela apagou a luz do box de parto, trouxe uma luminária e virou para a parede fazendo uma penumbra no local onde estávamos e me perguntou se eu havia levado um CD de músicas, eu disse que não porque achava que meu parto não seria naquele dia. Ela conversava comigo, falava que eu estava ótima, que eu era forte e ia conseguir, a aluna dela, a Soraia, me massageava. Enfim, me orientaram bastante, me senti acolhida e insisti.
Quando foi 00:20 do dia 12/12 ela fez um toque: 10cm de dilatação era hora de começar a fazer força. A bolsa estourou, o som foi inconfundível e nossa quanto liquido! Bateu um frio enooorme na barriga, afinal agora só dependia de mim, eu tinha que ajudar minha filha a nascer.
Ela sugeriu uma posição: banquinho de cócoras, aceitei, fazia muitaa força a cada contração que vinha e nada, estava doendo muito (mesmo com anestesia eu sentia tudo, acho que o efeito estava passando), comecei a ficar muito cansada e pedi para deitar. Ela deixou, mas avisou que a posição não favoreceria, eu sabia, mas me sentia muito cansada. Então quando as contrações vinham, a Soraia me orientar a ficar de lado, com uma perna levantada, eu fazia a força e NADA. Colocaram uma barra na cama pra eu empurrar com os pés na hora da força e NADA. Resolvi agachar na cama e apoiar os braços na barra ficando de cócoras, quando as contrações vinham, e quando elas passavam eu me deitava novamente para descansar. Fiz muita força, estava super exausta, falei diversas vezes que não agüentava mais, que queria desistir, que não conseguiria, e a Danúbia sempre dizendo que eu tava ótima. De repente falou que já dava pra ver a cabecinha, coloquei a mão e senti, foi maravilhoso, minhas forças se renovaram, pedi pra mudar mais uma vez de posição e voltei para a inicial, no banquinho de cócoras.
Com mais algumas forças a cabecinha da Letícia ficou na metade, não senti o tal “círculo de fogo”, mas uma sensação estranhíssima, me senti "entupida", pensei agora não tem mais volta, na próxima contração a cabeça saiu, como estava de cócoras num banquinho vi tudo: minha filha tava com o olhão aberto olhando pra mim, aquilo era maravilhoso, estava linda, nem me lembro se ela chorava, comecei a chamá-la, deseja-la, falar palavras bonitas para ela, queria tanto pegá-la. A Danúbia me pediu para ter calma, e só fazer força na próxima contração. Fiz dessa maneira e o corpinho saiu, peguei a Letícia na mesma hora. Toda linda, cheirosa, cheia de vernix, beijei-a, ficamos abraçadinhas uns minutinhos e a Danúbia começou a desenrolar o cordão do pescocinho da Letícia, preparou o lugar do corte e o papai cortou o cordão. Em meio a esse momento de êxtase, tomei uma injeção de ocitocina para ajudar na saída da placenta e na prevenção de hemorragias puerperais. A placenta saiu logo em seguida, inteira (nossa como é feia, parece carne de açougue eheeh). É impressionante como não existe mais nenhuma dor! Só alívio, prazer e amor.
A Letícia nasceu as 01:35, com 43cm e 2,360kg bem pequenina, mas muito esperta, apgar 9/10.
E eu havia conseguido o parto normal que tanto queria! Não sozinha, consegui porque encontrei pessoas maravilhosas nas listas de discussão, em especial as mulheres da ONG Bem Nascer, que muito me ensinaram, e que fazem um trabalho precioso de conscientização e troca de experiências que certamente ajudam a muitas mulheres. Consegui porque a Danúbia e a Soraia foram muito carinhosas, pacientes e competentes. Consegui porque já quase no fim do caminho, tive a oportunidade de me consultar algumas vezes com o Dr.Lucas, que é um GO super atencioso, carinhoso e humano, e em todas as minhas consultas me fazia sair do consultório desejando, construindo e sonhando com O MEU PARTO, sempre me passou segurança e me fez acreditar na minha capacidade de parir. Agradeço ainda a Luciana que ficou comigo todo o tempo que pode, e aos amigos e familiares que torceram para que tudo desse certo pra nós.
Sem vocês certamente eu não teria realizado o meu sonho de ser mãe, no sentido estrito da palavra e de ter um parto normal!